A escritora Carmen Sanchez Gil foi buscar nas origens da colonização, a fonte de inspiração para escrever Vida de Mulheres, seu terceiro livro, lançado recentemente pela editora Olcana. Para quem gosta de história, é uma leitura interessante, pois mostra o desbravamento do Brasil selvagem, recém descoberto e prestes a ser colonizado, sob o olhar feminino. Trata-se de um romance, com todos os elementos de uma história de ficção, mas não deixa de ser baseado em situações comuns no período.
Geralmente, a história da colonização só é contada pela ótica masculina, principalmente porque nas origens do nosso país, boa parte das mulheres que aqui chegaram vieram por obrigação: ou porque seguiam os maridos, militares portugueses, donatários ou sesmeiros com a tarefa de povoar a colônia e dela extrair riquezas para Portugal, ou eram órfãs mandadas para o país pela Coroa, para se tornarem esposas dos primeiros colonos.
As outras mulheres que já viviam aqui quando da chegada dos portugueses, eram as indigenas. Boa parte delas foi estuprada e transformada em escrava. A partir de meados do século XVI, com o início do tráfico negreiro para o Brasil, as africanas também teriam o mesmo destino. A violência porém, embora caísse com muito mais força sobre as índias e negras, não deixava de atingir as mulheres brancas, que enfrentavam desde os riscos da travessia do Atlântico (o que também acontecia com as africanas confinadas nos navios negreiros), até o casamento forçado e a violência doméstica. Inclusive, as sinhás – segundo Gilberto Freire detalha em Casa Grande & Senzala – costumavam se vingar dos maus-tratos sofridos dos maridos, nas escravas com as quais os senhores costumavam deitar. Além da violência sexual por parte dos donos dos engenhos, as mucamas sofriam também castigos físicos impostos pelas senhoras ressentidas. É de se imaginar onde estaria a solidariedade feminina naquele período? A resposta é que estava soterrada sob camadas de ódio racial. A solidariedade existia, mas entre os grupos étnicos, com raras excessões.
SOBRE O LIVRO: A história de Vida de Mulheres tem início em Granada – Espanha e narra à saga de Carmel, filha caçula da família Flores, proprietária de vastas terras produtivas. A época retratada enfoca uma sociedade oprimida por um regime desumano, onde imperam a violência, o machismo e o desrespeito.
A espanhola Carmel, dotada de uma personalidade forte, como convém às heroínas literárias, se interessa por histórias de países do outro lado do oceano. O Brasil com suas belezas naturais recém descobertas, aguça a curiosidade de Carmel, que decide casar-se com um militar português prestes a assumir um regime lucrativo em terras brasileiras.
No Brasil, longe da proteção familiar e casada com alguém que mal conhecia, Carmel vive o desamor e a decepção. Volta-se então para outras mulheres com histórias de vida parecidas com a dela. Apesar de desvalorizadas pela sociedade de então, essas mulheres guardam uma inesgotável sabedoria interior.
A ideia do romance de Carmen Sanchez Gil é reverenciar o exemplo de luta pela liberdade, a criatividade, a fibra e o talento femininos que possibilitaram que elas sobrevivessem àqueles tempos indomáveis e tornou-as capazes de grandes transformações sociais.
Trata-se de uma obra apaixonada e que, por partir do ponto de vista feminino, valoriza a participação das colonas brasileiras na formação do nosso povo e cultura. Vale pelo resgate de uma história que sempre foi contada por homens e em cuja narrativa as mulheres ocupavam notas de rodapé.
Ficha Técnica:
Vida de Mulheres
Autora: Carmen Sanchez Gil
Editora: Olcana
465 páginas
Preço sugerido: R$ 39,90
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Leia também:
>>Artigo: Mulheres e educação no Brasil colônia (em pdf)
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