Artigo: Verdades e mitos sobre a homossexualidade

Conversa de Menina, em defesa da diversidade, coloca a colherzinha em um tema tabu: a homossexualidade. Frequentemente, discuto com amigos o porque do ser humano ter tanto interesse na sexualidade alheia, sua orientação, e as escolhas que faz na vida: se opta por assumir determinado comportamento, se o esconde, se fala ou não do assunto, com quem dorme ou deixa de dormir. Pessoalmente, creio que a sexualidade de cada um é tema de interesse próprio e privado. Mas, diante do preconceito dominante, algumas bandeiras precisam ser carregadas e estratégias de luta estabelecidas. Luta essa para que se conquiste o direito tanto à livre expressão pública quanto a manter o assunto na esfera do pessoal, se essa for a vontade de alguém. Luta para que uma pessoa não seja julgada por sua sexualidade, mas pelo caráter e postura ética na vida. Certa vez, motivada pelo comentário de um leitor do jornal onde trabalho, travei longo debate com um colega sobre se o correto é dizer “orientação” ou “opção” sexual. Minha resposta, na ocasião, acabou meio parecida com a opinião da Maria Helena Vilela, que preside o Instituto Kaplan, focado em educação e sexualidade. Orientação é o termo que define, enquanto opção é o que vai marcar a escolha do indivíduo em assumir ou não determinada orientação. No fim das contas, são termos complementares, que vêm sendo usados como sinônimos ou mesmo confundidos e reconfigurados para depreciar, ao invés de incentivar a compreensão e aceitação.

Neste domingo, dia 6, acontece a 14ª Parada do Orgulho LGBT, em São Paulo, manifestação pela diversidade sexual que é considerada a segunda no mundo em tamanho e importância. Motivada pela data, Maria Helena Vilela escreveu um artigo sensível e, em certa medida, didático, desconstruindo alguns mitos sobre a homossexualidade. A linguagem educativa tem razão de ser: o Instituto Kaplan trabalha há 18 anos com capacitação técnica de professores para abordar a educação sexual nas escolas, mas também direciona seu foco ao público jovem. Aqui no blog, por exemplo, já publicamos um artigo da Maria Helena, sobre gravidez na adolescência, que é um dos nossos posts mais lidos.

Confiram o novo texto da pesquisadora:

*Verdades e mitos sobre a homossexualidade

**Maria Helena Vilela

Quando se trata de comportamento sexual, a lógica pode significar preconceito. A probabilidade de se fazer uma avaliação errada é muito alta. Cada pessoa é única e traz consigo histórias e circunstâncias de vida, das quais nem sempre é capaz de dar conta.

Dia 6 de junho, realiza-se em São Paulo a 14ª Parada do Orgulho LGBT. Um marco nos direitos civis. No trabalho de estudo da sexualidade humana, o Instituto Kaplan defende, no desenvolvimento de metodologia para capacitar professores e técnicos de saúde, a aplicação da educação sexual nas escolas e empresas, sem preconceitos, explicando os direitos sexuais de todos cidadãos.

É preciso deixar claro que a homossexualidade é o desejo de se vincular emocional e sexualmente com alguém do mesmo sexo. Ou seja: um outro jeito de ser, no que se refere à pessoa por quem se sente tesão. Apesar de ser um fenômeno aparentemente simples, ainda há muitas idéias erradas sobre ele. Até bem pouco tempo, a homossexualidade era considerada uma doença. Hoje já se sabe que não é.

Muitas teorias tentam explicá-la, mas ainda não existe um consenso. A mais aceita das teorias é aquela que fala sobre a combinação entre uma predisposição genética e fatores psicológicos (a forma como cada pessoa registra fatos, sentimentos e impressões) e sociais (o meio em que vive, a forma como a família lida com a valorização sexual e a cumplicidade entre os sexos).

O objetivo deste texto é esclarecer alguns tabus e preconceitos que existem sobre o tema. E existem muitos: homossexualidade seria uma escolha, ou resultado da falta ou do excesso de sensibilidade, ou ainda da frustração amorosa em relação às pessoas do sexo oposto. E ainda há os que pensem que a homossexualidade é uma doença mental, ou um desvio psicológico.

Os preconceitos:

1. Uma questão de escolha?!

Ninguém é capaz de escolher por quem sentirá tesão. Não conheço nenhum trabalho que traga o depoimento de um único homossexual que faria a escolha da homossexualidade, se pudesse, porque, mais que ninguém, o homossexual sente o peso da discriminação social. Do mesmo jeito que as pessoas não escolhem suas preferências entre loiros ou morenos, “sarados” ou barrigudos, sérios ou divertidos, elas também não conseguem determinar se o desejo é por alguém do mesmo sexo, do sexo oposto ou de ambos. Apenas realizar ou não o desejo afetivo-sexual, pôr em prática o relacionamento é que é uma questão de opção que pode ser feita ou não pelo indivíduo.

2. Uma questão de sensibilidade?!

Existe uma crença popular de que um homem sensível e delicado é homossexual. A sensibilidade é a capacidade de sentir e perceber o que está acontecendo a nossa volta e não tem nada a ver com a orientação sexual de uma pessoa. A garota pode ter um jeito mais grosseiro de lidar com as pessoas e nem por isso ser lésbica, ou o garoto ter certo trejeito e não ser gay. O papel sexual, ser masculino ou feminina, não tem nada a ver com a orientação sexual (a orientação do desejo). Muitos meninos agressivos e meninas delicadas podem ser homossexuais.

3. Frustração amorosa?!

Muitas pessoas acreditam que as lésbicas são mulheres que não conseguiram arranjar namorado, ou que sofreram algum trauma com homens. Esta explicação existe, porque é difícil para as pessoas heterossexuais imaginar que o prazer sexual feminino seja possível sem a presença do pênis. Quanto aos gays, muita gente acha que a homossexualidade é decorrente de uma experiência traumática nas primeiras relações sexuais com uma mulher. Os homossexuais não são heterossexuais frustrados! São pessoas, cujo desejo sexual está no outro, que é do seu mesmo sexo.

4. Homossexualidade é doença mental ou desvio psicológico?!

Nem uma coisa e nem outra! Durante muito tempo, a homossexualidade foi interpretada pela medicina como uma doença. Mas, na década de 70, todas as associações de profissionais de saúde mental, inclusive a OMS (Organização Mundial de Saúde) concluíram que não se tratava de uma doença mental ou de distúrbio psicológico. Portanto, não existe tratamento para uma pessoa “deixar de ser homossexual”. O que a medicina ou a psicologia podem fazer é prestar ajuda para que o homossexual aprenda a lidar com o seu jeito de ser, sexualmente diferente do que a sociedade deseja para ele, sem deixar que isto atinja as outras características pessoais. Ou seja, é possível ser homossexual e ser, ao mesmo tempo, um profissional competente, um filho amoroso, um amigo corajoso, um cidadão que conhece e respeita seus direitos e deveres, uma pessoa divertida, feliz e que pode e deve conquistar o respeito de todos.

Cena do filme O Segredo de Brokeback Montain, de Ang Lee

Mudar o rumo da História

Muitas pessoas não se conformam com a existência da homossexualidade, principalmente quando o homossexual é alguém próximo e querido. Todos querem saber o que podem fazer para conseguir ajudar alguém a “não ser homossexual”. Não existe esta possibilidade. Até o momento, ainda não foi cientificamente comprovado nenhum tipo de procedimento que faça de alguém homo, bi ou heterossexual. O que nós sabemos é que, na nossa sociedade, existem jeitos sexuais diferentes de ser. E o que se pode fazer é aprender a lidar com as diferenças. Diferença não é sinônimo de deficiência! É um outro jeito de ser humano.

A sexualidade se desenvolve em contextos diversos, a partir de experiências distintas. Portanto, é inútil se ter o desejo de que todas as pessoas correspondam ou se ajustem a um único modelo para ser sexualmente feliz.

*Material encaminhado ao blog pela jornalista Vera Moreira

**Maria Helena Vilela é diretora do Instituto Kaplanwww.kaplan.org.br

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