Vi a reportagem na TV de madrugada: O Museu da Língua Portuguesa abre nesta quarta uma mostra em homenagem à poeta Cora Coralina. Pensei com meu teclado (não estava usando roupa com botões), taí uma boa oportunidade de falar de Cora no blog. Vamos saber um pouco mais sobre ela? Reproduzo também alguns de seus belos e delicados poemas. Aproveitem!
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Quem é?
Cora Coralina nasceu Ana Lins dos Guimarães Peixoto Bretas, em 20 de agosto de 1889, as margens do Rio Vermelho, na cidade de Goiás, em uma casa antiga, de construção datada do século XVIII; e morreu em 10 de abril de 1985, em Goiânia. Passou a vida entre o interior de Goiás e o interior de São Paulo, para onde se mudou após casar-se e onde morou por 45 anos.
Cora começou a escrever aos 14 anos, embora só tivesse cursado as quatro primeiras séries do ensino fundamental. Exercia oficialmente a profissão de doceira, mas também trabalhou vendendo livros e fabricando linguiça, após ficar viúva. A notoriedade porém, só viria aos 75 anos, quando Carlos Drummond de Andrade escreveu um artigo elogioso ao primeiro livro da poeta, Poemas dos Becos de Goiás.
Além de escrever poemas, Cora Coralina também era contista e cordelista. Seu primeiro conto, escrito aos 14 anos, foi publicado em um jornal da sua cidade natal. A prosa e os versos da autora são ricos em simplicidade e em cenas do cotidiano do Brasil do interior. A vida doméstica e as cenas da infância e juventude de Cora servem de inspiração para compor pequenos libelos a vida. Muito difícil alguém que tenha nascido em cidade pequena, não se identificar com a autora.
Uma das filhas de Cora Coralina, Vicência Tahan, escreveu a biografia romanceada Cora coragem, Cora poesia, lançada pela Global editora, em 1989.
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Cora em versos:
Versos… não
Poesia… não
um modo diferente de contar velhas histórias
Cora Coralina (Poemas dos Becos de Goiás )
Todas as Vidas
Vive dentro de mim
uma cabocla velha
de mau-olhado,
acocorada ao pé
do borralho,
olhando para o fogo.
Benze quebranto.
Bota feitiço…
Ogum. Orixá.
Macumba, terreiro.
Ogã, pai-de-santo…
Vive dentro de mim
a lavadeira
do Rio Vermelho.
Seu cheiro gostoso
d’água e sabão.
Rodilha de pano.
Trouxa de roupa,
pedra de anil.
Sua coroa verde
de São-caetano.
Vive dentro de mim
a mulher cozinheira.
Pimenta e cebola.
Quitute bem feito.
Panela de barro.
Taipa de lenha.
Cozinha antiga
toda pretinha.
Bem cacheada de picumã.
Pedra pontuda.
Cumbuco de coco.
Pisando alho-sal.
Vive dentro de mim
a mulher do povo.
Bem proletária.
Bem linguaruda,
desabusada,
sem preconceitos,
de casca-grossa,
de chinelinha,
e filharada.
Vive dentro de mim
a mulher roceira.
-Enxerto de terra,
Trabalhadeira.
Madrugadeira.
Analfabeta.
De pé no chão.
Bem parideira.
Bem criadeira.
Seus doze filhos,
Seus vinte netos.
Vive dentro de mim
a mulher da vida.
Minha irmãzinha…
tão desprezada,
tão murmurada…
Fingindo ser alegre
seu triste fado.
Todas as vidas
dentro de mim:
Na minha vida –
a vida mera
das obscuras!
Cora Coralina
Aninha e suas pedras
Não te deixes destruir…
Ajuntando novas pedras
e construindo novos poemas.
Recria tua vida, sempre, sempre.
Remove pedras e planta roseiras e faz doces. Recomeça.
Faz de tua vida mesquinha
um poema.
E viverás no coração dos jovens
e na memória das gerações que hão de vir.
Esta fonte é para uso de todos os sedentos.
Toma a tua parte.
Vem a estas páginas
e não entraves seu uso
aos que têm sede.
Cora Coralina (Outubro, 1981)
O Passado…
Homens sem pressa,
talvez cansados,
descem com leva
madeirões pesados,
lavrados por escravos
em rudes simetrias,
do tempo das acutas.
Inclemência.
Caem pedaços na calçada.
Passantes cautelosos
desviam-se com prudência.
Que importa a eles o sobrado?
Gente que passa indiferente,
olha de longe,
na dobra das esquinas,
as traves que despencam.
-Que vale para eles o sobrado?
Quem vê nas velhas sacadas
de ferro forjado
as sombras debruçadas?
Quem é que está ouvindo
o clamor, o adeus, o chamado?…
Que importa a marca dos retratos na parede?
Que importam as salas destelhadas,
e o pudor das alcovas devassadas…
Que importam?
E vão fugindo do sobrado,
aos poucos,
os quadros do Passado.
Cora Coralina
Considerações de Aninha
Melhor do que a criatura,
fez o criador a criação.
A criatura é limitada.
O tempo, o espaço,
normas e costumes.
Erros e acertos.
A criação é ilimitada.
Excede o tempo e o meio.
Projeta-se no Cosmos
Cora Coralina
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>>Para saber mais sobre a mostra em homenagem a Cora (Estadão)
>>Post no blog sobre o Museu da Língua (publicado em 21 de março)
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