Letícia estava na fila do supermercado, cansada depois de um dia inteiro de trabalho. Só conseguia pensar em sair dali correndo, largar todas as compras e ir pra casa tomar um banho e dormir. O local estava lotado, pensou até fingir uma gravidez – as gordurinhas ajudariam – e pegar a fila preferencial. Depois pedia perdão a Deus. Desistiu, com receio de ele não a perdoar. Rodara todos os caixas, para ver se acharia uma fila menor. Nada.
O humor não era dos melhores. Já estava há duas noites sem dormir direito, efeito das mudanças de horário dos plantões. Mentalmente, xingava a quinta geração de quem inventara as filas de supermercados e a sexta geração de quem inventara trabalho na madrugada. O rosto não escondia a raiva de estar ali: testas frisadas, olhos semicerrados e um bico de assustar qualquer um.
Impaciente e descuidada, ansiosa por chegar logo ao caixa e se livrar da tarefa, Letícia empurrou o carrinho de compras além do que deveria. Por pouco não atropela o pé do rapaz que estava à sua frente, conversando com um amigo. Constrangida e sem jeito, deixou o sorriso se abrir para pedir desculpas.
“Você tem um sorriso lindo. Um dos sorrisos mais lindos que já vi na minha vida”, foi a resposta do rapaz. Letícia voltou a sorrir, desta vez um pouco sem graça pelo inesperado elogio, e agradeceu a gentileza. O rapaz descarregou suas compras no caixa e após pagar a conta, disparou: “Você deveria sorrir sempre, andar sorrindo. Seu sorriso é capaz de fazer alguém feliz”.
Desta vez é ele quem sorri, e ao virar para ir embora, ouve de Letícia: “E você deveria elogiar sempre. Seu elogio é capaz de fazer alguém feliz”. Ambos sorriram, o rapaz seguiu seu rumo, e Letícia continuou descarregando suas compras, mas agora com um leve sorriso no rosto.
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