Normalmente dirigimos exclusivamente para chegar ao destino. No trajeto, vamos pensando na vida, ouvindo música, conversando com o carona ao lado. Nos estressamos, xingamos o motorista vizinho, buzinamos para sinalizar o descontentamento com o vacilo de um outro motorista. E assim a gente segue em frente, pensando em tudo no trânsito, menos na rotina de tráfego. Reclamando de todos, mas sem melhorar a nossa própria postura no trânsito.
Não podemos generalizar, essa é a regra. No entanto, observando o trânsito nos últimos dias tenho percebido que são raras as exceções. Todo mundo quer ser o mais esperto no trânsito. Além disso, cada um se acha com mais direito, com mais pressa que o outro. É uma situação em que o egoísmo e individualismo mostram todas as suas faces mais cruéis. E sem pena. Ando frustrada com essa situação toda, diria até triste e decepcionada de ver o quão mal educados somos enquanto motoristas.
As situações são variadas. Posso exemplificar, e quem mora em Salvador vai entender. Faço com uma certa constância o percurso da Avenida Tancredo Neves para o Caminho das Árvores, passando pela Magalhães Neto e entrando na via que dá acesso ao Hospital da Bahia. Em um determinado momento, a via única se transforma em dupla: uma para quem vai seguir em frente de volta à Av. Tancredo Neves, e outra para quem quer virar à esquerda, rumo ao Hiper Bompreço.
A situação é essa. São duas sinaleiras, cada uma para quem quer tomar um rumo. Os carros fazem uma fila, aguardando a sinaleira que permite entrar à esquerda abrir. Como a via é estreita, a fila às vezes cresce ao ponto de nem todos os carros conseguirem passar antes de a sinaleira fechar novamente. E aí, os “espertinhos” entram em ação. O sinal abre, os que estão lá atrás da fila começam a cortar a via, tomando o caminho de quem seguiria reto, para lá na frente cortar os veículos e entrar à esquerda.
É tanta falta de educação, que fico pensando. Discutimos tanto sobre a educação formal, sobre o problema das nossas escolas. E temos um outro problema educacional, tão grave quanto. A educação doméstica, aquela que não se aprende apenas na escola, mas que se aprende na vida. A educação que é fundamental para conseguirmos viver em sociedade. A educação que gera a gentileza e a compreensão. Essa faz falta inclusive aos mestres, doutores e pós-graduados vida afora.
Outro caso típico acontece na Rua Djalma Dutra. A saída da rua dá duas opções ao motorista: seguir em frente, pela Sete Portas, sentido Aquidabã, ou virar à direita, no sentido Dois Leões. Para quem quer seguir em frente, há uma sinaleira. Mas para quem quer virar à direita, a mão é livre. Novamente os espertinhos enchem os olhos. Apressados e irritados com a fila que se faz para aguardar a sinaleira, eles se sentem no direito de invadir a via da direita e engarrafar a vida de quem não precisaria esperar pelo sinal.
Estes são apenas dois dos inúmeros casos que vivencio diariamente. E a falta de educação não é apenas de um motorista em relação ao outro. Acontece de forma muito mais agressiva com relação ao pedestre. Quantas vezes vejo um motorista acelerar o carro ao perceber que um pedestre tenta atravessar uma via, obrigando a pessoa a correr, acelerar ainda mais o passo. Para que? Muito mais educado é diminuir a velocidade, respeitar o pedestre, que é o lado infinitamente mais vulnerável da relação.
Faixa de pedestres, então, serve para que em Salvador mesmo? É preferencial do pedestre, será que é tão difícil compreender isso e respeitar? Poderíamos ter uma vida muito menos estressante no trânsito se todos sempre tentassem se colocar no lugar do outro. Se você não quer que cortem a fila na frente do seu carro, não faça o mesmo com o outro. Se você quer conseguir atravessar uma rua sem riscos, pense nisso ao visualizar um pedestre tentando enfrentar a loucura do tráfego para chegar ao outro lado.
Os órgãos de fiscalização também não ajudam. Lembro bem do caso da Baixa de Quintas, um bairro que concentra uma grande quantidade de lojas de peças de veículos, mas não possui estacionamento apropriado. Os motoristas fazem o que querem ali. Quando todas as vagas à frente das lojas estão ocupadas, eles param no meio da rua, do jeito que bem entendem, engarrafando tudo. E isso acontece diariamente, aos olhos dos fiscais. E ninguém faz nada. Um dia após o outro, a situação é exatamente a mesma.
A mudança de comportamento não é algo difícil. Basta a conscientização. Ela é fundamental. A vida é tão corrida, já temos tantos problemas, tantos leões para enfrentar diariamente, para que procurarmos mais um motivo de estresse? O que acontece é que estas atitudes acabam irritando no trânsito. Não precisamos ser os mais espertos. Precisamos ser os mais educados. Não basta ir à escola, fazer uma universidade, se especializar. É preciso ser educado na vida, educado nas relações sociais.
Se você teve a curiosidade de ler este texto até aqui, peço, de coração, que leve estas palavras para o seu comportamento no trânsito. Que se esforce para tentar conscientizar os mais próximos sobre a importância de ser educado e gentil. Não sou de levantar bandeiras, mas abraço qualquer causa que objetive a melhoria e a evolução das relações pessoais. E essa é uma delas.
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