A boa filha à casa torna

Voltar sobre os próprios passos e retomar sonhos antigos não me metem medo. Acredito que a gente nunca retoma um caminho sendo a mesma pessoa. E nos quase cinco anos em que me afastei do Conversa de Menina para cuidar de outros projetos, muita água rolou embaixo das pontes que atravessei. Aprendi algumas coisas novas bem legais, desaprendi outras antigas nem tão bacanas assim. Gente boa entrou e saiu da minha vida (deixando suas marcas indeléveis), gente nem tão legal tentou entrar, mas não deixei ficar nódoa. A ideia é sempre evoluir e reeditar uma versão melhor de nós mesmas e faço tal e qual a Penélope da mitologia grega, costuro e desmancho os pontos quantas vezes forem necessárias.

O dito universo feminino sempre exerceu um grande fascínio sobre mim. Tanto no que diz respeito às pequenas vaidades atribuídas às mulheres, quanto por seu lado mais reflexivo, filosófico, espiritualizado. O sagrado feminino, a alma feminina e sua sensibilidade e capacidade de desenvolver empatia e abraçar causas e salvar o mundo e cuidar das dores umas das outras.

Mulher, para mim, que cresci em uma família matriarcal, multiétnica e acolhedora, sempre foi sinônimo de união, nunca de rivalidade. Antes mesmo de saber o que o conceito de *sororidade significava, me sentia parte da grande teia invisível que conecta todas as mulheres e nos torna cúmplices e aliadas umas das outras.

Da amizade de Alane, minha parceira de criação do Conversa lá nos idos de 2008, nunca abri mão. Embora, nem sempre a gente tenha conseguido se ver ao vivo e em cores com a frequência desejada. Abençoadas as redes sociais, que nos mantém próximas mesmo quando distantes.

Quando ela perguntou se eu queria voltar a cuidar dessa nossa filhota virtual, aliás ela nunca desistiu de me trazer de volta, senti que era a hora de retomar esse caminho, mas com a bagagem extra de tudo o que andei aprendendo e desaprendendo nos últimos anos. E é esse amontoado de coisas que pretendo compartilhar com vocês, espero que gostem e que não fiquem tímidas em participar do papo, opinar e me ensinar com suas visões de mundo.

Um filme para dividir:

the-first-graderAssisti um filme essa semana chamado The First Grader (no Brasil é conhecido por Uma lição de vida e na Netflix consta no catálogo como O aluno. Produção de 2010, dirigida pelo britânico Justin Chadwick). Conta a história real de um idoso queniano chamado Maruge, que consta no Guiness Book como a pessoa mais velha do mundo a alfabetizar-se.

Maruge foi militante pela independência do Quênia, nos anos 1960, e nunca teve oportunidade de estudar na infância ou juventude. Bem velhinho, ouviu no rádio que o governo de seu país iria proporcionar educação gratuita para todos e assim, acabou em uma sala de aula com crianças de 6 anos, onde conheceu a professora Jane Obinchu, uma mulher engajada na causa da educação como missão de vida.

Uma das frases do filme que adotei para a vida: “Aprenderei até ter terra nas orelhas”. Fica a contribuição de Maruge como primeira lição que quero compartilhar com vocês. Somos todos aprendizes eternos.

Quem nunca viu o filme, mas gosta de histórias delicadas e cheias de esperança, #ficadica.

Até a próxima conversa!

*Sororidade: a palavra vem do latim sóror, que significa irmã. Traduz a ideia de união e aliança entre as mulheres, baseada na empatia e companheirismo e na premissa de que juntas somos mais fortes.

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Era pra ser só uma consulta com o otorrino

11Sim, era pra ser só uma consulta com o otorrino. Estava eu lá no Centro Médico, tinha acabado de sair da sessão de terapia, e decidi ligar para a marcação de consulta para saber se havia alguma especialidade médica com vaga disponível para aquela tarde. Eu já estava lá mesmo, e já estava na hora de marcar as tais revisões. A atendente, sorridente do outro lado da linha, disparou:

– Senhora, temos uma vaga agora mesmo para o otorrino! Quer que eu marque?

Não estava nos planos ouvir que havia vaga para o otorrino. Imaginei o oftalmologista, a ginecologista… Mas aí lembrei que já fazem alguns anos (sim, anos!!!) que sinto um pouco de falta de ar quando faço muita atividade intensa, precisando respirar pela boca. Lembrei também de uma dorzinha de cabeça chatinha que me persegue também há anos (e eu mesma diagnostiquei como enxaqueca!) e lembrei da sensação de estar sempre engolindo alguma coisa, como se houvesse um bolinho de carne na garganta.

– Ah, ótimo. Estava mesmo precisando de um otorrino! Pode marcar!

Dirigi-me à recepção, entreguei os documentos e comecei a mexer distraidamente no celular, enquanto aguardava ser chamada.

– Alane, sala 6!

Ouvi um berro. Berro mesmo! E fiquei perdida sem saber de onde vinha, porque a recepcionista continuava calada, entretida na frente do computador. Encontrei a sala 6 e descobri que quem me gritava era o médico (que será aqui chamado de Dr. X). Um senhor de seus 60 e poucos anos, magrinho, calvo e de bigode. Segui até a sala 6, ele já havia entrado lá. Ao abrir a porta, ele pediu que eu sentasse. Imediatamente ele levantou, saiu em disparada, resmungando alguma coisa que não consegui compreender e me deixou lá meio perdida. Voltou e me encostou na parede:

– Vamos lá, mocinha! Qual a sua queixa?

Expliquei o que já contei acima, meio insegura sobre os sintomas. Sem saber exatamente se ele ajudaria, se havia algo11 de errado comigo mesmo ou se ele daria uma gargalhada sutil e me mandaria procurar outro especialista. Mas não, ele começou um interrogatório. Tipo interrogatório meeeeesmo! Me senti na frente de um um juiz, um delegado ou algo do gênero.

– E você sente uma dor na cabeça, que sempre acha que é enxaqueca?

(Nossa, ele tem bolinha de cristal, pensei). Fiz uma afirmação contundente com a cabeça.

– E você sente falta de ar? Costuma acordar de madrugada com essa sensação de que o ar está faltando? E sente como se tivesse com o ouvido entupido? E costuma espirrar? Mas o espirro é uma vez só (e fez o som do “atchim”) ou você espirra duas, três vezes seguidas (e fez o som do “atchim, atchim, atchim”)? Essa resposta do espirro é muito importante para mim. Pense direitinho! E você sente como se algum alimento em sua garganta estivesse voltando? Fica rouca com frequência? Tosse muito? Pense bem que tudo isso é muito importante!

Foram tantas, tantas, tantas perguntas, que fiquei bem atrapalhada, tentando me recordar do que eu sentia, afinal. Eram sintomas de anos e para mim já pereciam bastante normais. Tentei ser o mais precisa possível, percebi que eu tinha vários dos sintomas que ele perguntava e nem tinha me tocado disso antes. E fui respondendo aos poucos, até que ele chega bem perto de mim, coloca as mãos no meu rosto e pressiona os dois dedos polegares na região da testa, logo acima dos olhos.

Dou um berro, senti uma dor insuportável. E ele, ignorando completamente meu gemido de dor, repete o mesmo movimento com os dedos entre os meus olhos, no início do nariz; e depois nas bochechas. Mais dois gritos de dor, cheguei a tentar afastar as mãos dele. Meio surreal. Daí ele tira os dedos, olha pra meu rosto e dispara:

– Você tem o rosto totalmente assimétrico, você sabia disso?

(Oi???????)

– Um lado de seu rosto é completamente diferente do outro. O normal é que fossem mais simétricos. Mas no seu caso um lado é bem diferente do outro!

(Hein??????)

11Fiquei meio sem saber o que responder. Enquanto ainda penso na afirmação dele, ele me manda abrir a boca, falar “aaaaaaaaaaaa”, coloca o palito na língua, olha, olha, olha.. vira, pega uma embalagem de alguma coisa e dispara o spray em minha garganta. Atordoada, começo a sentir tudo anestesiando… Pergunto a ele se é para engolir (eu já estava começando a engolir o tal produto). Ele solta um novo berro:

– Nãããããão!!! É para cuspir!

Joga uma vasilha de metal em meu colo, dois lenços em papel em minhas mãos. Volta-se para a mesa ao lado da cadeira em que estou deitada e, repentinamente, dispara a falar da situação do País, dos pacientes, dos médicos mais moços.

– É uma falta de respeito!! Você acredita que de sete pacientes hoje, só vieram quatro? E ninguém liga para avisar! Ninguém tem o mínimo de consideração pelo médico! Toda sexta-feira é isso!

Concordo com a cabeça, com a garganta anestesiada, uma sensação angustiante… Solto um “O problema são definitivamente as pessoas, os valores por aqui andam meio invertidos” sem saber direito se cabia à pergunta, de tão tensa que eu estava. Ele vira pra mim de novo, diz que precisa ver minhas laringes, me manda abrir a boca e enfia um tubo lá dentro, com a maior naturalidade… Arregalo os olhos, a vontade é tirar a mão dele dali e sair correndo, mas resisto, com vergonha… Ele continua:

– Por isso que esse país está assim, caótico! São as pessoas mesmo. Você sabe que o País vai desmoronar, não é? Você já sabe o que vai fazer? Já traçou seu plano B? Tem algum amigo ou parente fora do País para te dar abrigo? Eu vou embora deste País! Daqui a três meses vou morar na França. Vou pedir asilo político! Aqui não podemos ser de direita, somos perseguidos pelo PT. Não podemos ter um pensamento liberal!

Ele tira o aparelho, pensa alto “preciso olhar sua traqueia. Tenho certeza do que esperar de sua traqueia”. Vira de costas de novo, e continua seu desabafo:

– Você sabia que se pedir asilo político, tudo fica mais fácil para você? Eles te recebem, te oferecem um lugar para morar. Te dão um valor para você se manter. Entregam um cartão de identidade e você poderá ficar lá até a situação aqui no Brasil melhorar.

Volta-se pra mim de novo, joga um líquido em minhas narinas, sinto tudo anestesiar de novo, e lá vem ele com o tal aparelho enfiando no meu nariz! Fico acuada, é verdade, arregalo os olhos de novo. E ele dispara:

– Qual é o seu plano B, mocinha? O caos vai se instalar em seis meses, um ano no máximo.

Só consigo dizer a ele: “Neste momento, com esse troço dentro do meu nariz, eu não consigo nem raciocinar sobre meu plano A, quem dirá o B”.

Ele vira de costas de novo, fala mais uma vez consigo mesmo em voz alta: “Vai precisar cauterizar”. Eu continuo ali, 11estatelada na cadeira, sem me mover. E ele insiste, ainda de costas: “Preciso saber seu plano B”. Inspirada numa conversa recente que tive com uma amiga, disparo, tentando encontrar qualquer plano B que fosse convincente naquele momento: “Meu plano B é ir embora pra Portugal, fazer mestrado por lá”. Ele questiona: “Já tirou seu passaporte? Você não terá muito tempo. Precisa resolver isso pra ontem”. Eu respondo: “Vou resolver isso esta semana ainda, minha avó nasceu lá, deve facilitar”. Ele diz: “Ótimo, ótimo. O seu plano B é bom. Veja logo a faculdade”.

Novamente ele se vira pra mim, vejo que tem alguma coisa com um fogo ligado em cima da mesa, ele volta a jogar spray em meu nariz e enfia um tubo de um lado e do outro. Sinto um incômodo horroroso. Me dá vontade de sair correndo de novo! Resmungo de dor e bem baixinho: “Acho que a anestesia não funcionou muito bem”. Ele não responde, acho que nem ouviu. Tira os troços das minhas narinas, que começam a escorrer. Ele me dá vários lenços de papel e me manda assoar o nariz. Obedeço.

Ele continua, enquanto eu gasto todos os lenços: “Eu sabia. Você tem um quadro evoluído de sinusite. Tem rinite alérgica e um pequeno desvio no septo nasal. Pare imediatamente de tomar café e refrigerante, comer pimenta, chocolate e frutas cítricas. Eu vou te curar dessa sinusite e vamos tratar sua rinite alérgica. Será um tratamento longo, a princípio de 90 dias”.

Preocupada com a história do desvio, pergunto a ele: “e o desvio do septo nasal, Dr., é grave?”. Ele me diz que cuidaremos do septo nasal depois e me dá uma bronca velada por não ter procurado um médico antes. Informo a ele: “Mas eu já fui pra otorrino diversas vezes na vida. Eu nunca tive um diagnóstico assim. Até já tive crise de sinusite há muitos anos e… “. Ele não perde tempo, me interrompe e volta a disparar a metralhadora verbal:

– Sabe qual é o problema? Esses médicos de hoje! Eles lidam com o paciente como se o paciente fosse um inimigo querendo destruir sua vida profissional, com um processo! Muitos são orientados por advogados, sabia? Aí os médicos passam exames e mais exames e querem simplesmente se livrar dos pacientes. Eles não dão diagnósticos. E aí acontece o que aconteceu com você. Ficam penando com sintomas simples de serem resolvidos. Um verdadeiro absurdo. Esse país não tem mais jeito mesmo. Tudo culpa das pessoas…

Ele continua resmungando, enquanto me entrega uma receita médica. Me orienta a tomar três medicamentos: um por cinco dias, o segundo por 60 dias, e o terceiro por 90 dias. Ele me diz que o tratamento será longo, que terei de passar uns dois ou três anos acompanhada por ele. Mas que depois do tratamento serei uma nova mocinha. Me diz para evitar ingerir lactose. Fico arrasada com essa informação e já resisto em segui-la. Chocolate, tudo bem, Mas lactose??? Ah, não.

Ele me dá um outro papel e me diz que devo entregá-lo à recepcionista. Despede-se de mim rapidamente, me diz para voltar com 60 dias. Levanto, saio da sala e leio o papel. Lá tem dois itens descritos. O primeiro diz: laringoscopia e traqueoscopia. O segundo: corneto inferior cauterização linear. Chego em casa e pergunto ao Dr. Google o que significava cada um daqueles procedimentos. No final da consulta mais sem noção que tive na vida, saio ao menos com a sensação de que alguém finalmente tinha conseguido achar um diagnóstico pros sintomas que eu sentia há anos e que eu nem sabia que significava alguma coisa.

Quando saí da clínica, pensei a frase que deu nome a esse texto: “Era para ser só uma consulta com o otorrino”. Imaginei que entraria no consultório, sairia com exames a fazer, voltaria em alguns dias…  Não estava psicologicamente preparada para aquela sessão de horror. Não sei vai dar certo, mas saí animada para começar o tratamento e já pensando o que me espera daqui a 60 dias no nosso reencontro. Tentarei marcar novamente a terapeuta antes dele. Mas certamente o tema do meu encontro com ela será outro.

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Making off: saiba como se monta um editorial de moda

Tem um tempo que estou para publicar esse material muito bacana que a jornalista Jane Fernandes preparou para vocês, com todo o carinho, mostrando os bastidores de um editorial de moda. Corre daqui, corre dali, às vésperas de encarar a maratona de plantões carnavalescos, tiro da gaveta, para deleite das fashionistas e pesquisadoras deste vasto mundo da beleza feminina. Os bastidores de uma produção de moda sempre rendem uma curiosidade enorme. Nesse caso, o texto e as fotos tratam da realização de um ensaio da revista europeia ModaCycle, que movimentou as ruas do Centro Histórico de Salvador, em meados de fevereiro. A produção de maquiagem contou com a experiência de Valeria Meier, make up artist baiana radicada na Suiça, que também em fevereiro, deu curso de automaquiagem e foi convidada especial do encontrinho do blog (relembrem aqui).

Em tom de crônica, de quem observa a cena, Jane une jornalismo e subjetividade. As fotos, também de sua autoria, só ajudam a compor o cenário montado na nossa imaginação a partir da sua narrativa. Deu vontade de estar lá, mas como não estávamos, saibam o que está por trás do glamour que vemos nas revistas e divirtam-se! Eu me diverti…

Por trás da cena fashion

*Jane Fernandes

Quando vemos fotos maravilhosas que nos fazem desejar a roupa da modelo, o sapato que ela usa ou a maquiagem perfeita que exibe, mal podemos imaginar a trabalheira por trás de um editorial de moda. No último dia 14 estive nos bastidores de um editorial produzido em Salvador para a revista europeia ModaCycle e aproveito o espaço para dividir essa experiência com vocês.

Tudo começou com um imprevisto, a van alugada para servir de camarim, armário, transporte e o que mais fosse preciso teve um problema mecânico. Assim que a locadora enviou uma van substituta, a maquiadora Valéria Meier partiu para buscar a modelo Bruna Cabral e seguirem para a sede da D’Malicuia. O relógio marcava 10h quando Valéria e a prima Andressa começaram a arrumar o cabelo de Bruna. O calor era escaldante e a modelo a cada instante ganhava mais volume no cabelo, formando um moicano pra lá de estilizado.

O clima era de colaboração, o fotógrafo Fábio Abu-chacra definia com a modelo que a linha era natural, enquanto seus assistentes ajudavam a segurar o material de maquiagem, as meninas da D’Malicuia (Diane Lima e Mari França) ajudavam a definir os detalhes da make up e Andressa bancava a manicure. Eu, me limitava a observar, fotografar e, às vezes, perguntar. Como fiz quando Valéria colou um fita crepe na testa da modelo após preparar a pele da menina com base, corretivo e todos os produtinhos mágicos que usa para esse fim. Me assustei por não saber detalhes da proposta, mas a fita era para delimitar bem a área dos olhos a ser pintada, assim como se faz com as paredes, hehehe.

A tarde já tinha começado quando saímos em direção ao Santo Antônio Além do Carmo. Primeira parada: Antoniu’s Bar. Hora de descarregar todo o equipamento, medir a luz e fazer todos os ajustes para as primeiras fotos. A modelo vai entrando no clima de não fazer pose e logo está “esbarrando” no balcão deste bar com ares de armazém das antigas. Lembrei de Seu Elias, do Sítio do Pica-pau Amarelo, claro que foi viagem minha, mas fazer o quê se eu lembrei?

Sequência concluída e hora de trocar de roupa, sapato e acessórios, enquanto Fábio e equipe preparam tudo para o cenário de rua, que inclui uma parede que mescla grafite e pichação. As trocas de roupa são feitas na van, tarefa facilitada por um figurino composto de vestidos, saias e blusas. Ao longo do ensaio a modelo usou seis looks diferentes e era para carregar todas essas peças que a van fazia as vezes de armário.

Nessa locação,  a ideia é colocar a modelo em movimento, então ela caminha em direção aos rebatedores, enquanto o fotógrafo a enquadra em diferentes ângulos. Bruna vem direto, vem e gira, vem e pula, vem, vem e vem inúmeras vezes, e o cabelo começa a exigir os primeiros retoques: um grampinho (ou vários) no lugar certo e muito laquê para segurar o topete. Para compensar, na próxima parada, uma pousada cheia de charme, a modelo fica o tempo todo sentada numa rede. Aí, o trabalho maior foi de Fábio e seus assistentes às voltas com todos os ajustes necessários para conseguir um perfeito jogo de luz e sombra.

Ao escurecer, fizemos um pequeno lanche em frente à igreja do Boqueirão. O dia começou com sanduíches, coxinhas e refrigerantes ainda na D’Malicuia, passou por pastéis bem recheados e neste momento estava no sanduíche de padaria. Nada de parada para almoço ou qualquer refeição mais substancial. Para matar a sede, além de refrigerante tinhamos bastante água na caixa térmica, mas com a temperatura nada amena de Salvador, no final do dia a água estava longe de ser gelada.

Mas ninguém sofria, claro que depois das fotos na escadaria e na ladeira do Passo (últimas locações) estávamos todos exaustos, mas o saldo era super positivo, pois o dia também teve muita diversão e todos estavam super instigados.  Não acompanhei a seleção das fotos, então só verei o resultado quando a ModaCycle publicar o material, mas a mistura daqueles looks, com o cenário do Santo Antônio e a competência da equipe só pode resultar num editorial sensacional.

*Jane Fernandes é jornalista e proprietária da Quarta Via

**O texto foi cedido pela autora para o blog Conversa de Menina e publicado mediante citação da autoria e respeito à integridade do conteúdo. Todos os direitos são reservados à Jane Fernandes/Quarta Via.

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Crônica de Menina: Amor não correspondido

*Texto de ficção criado por Andreia Santana

Débora amava Everaldo desde criança. E desde criança ele sempre a tratava como uma irmãzinha mais nova. Estava sempre por perto, ajudava a segurar todas as barras, secava suas lágrimas, a fazia rir, a levava para lá e para cá quando ela estava sem carro, até pagava as dívidas do seu cartão de crédito! Mas não queria ir além daquilo. “Somos amigos, quero ser seu amigo para sempre”. Mas ela queria mais, ela queria abraços que os transformassem em um só, queria beijos de tirar o fôlego, queria cenas de ciúmes, queria cartas de amor, serenata, sexo, carinho, quatro filhos, uma casa amarela, dois cachorros e um gato. Já tinha dito para ele, com todas as letras: ” eu te amo”, tinha se descabelado, tatuado o nome dele na pele, com henna, dançado nua, pixado as paredes do quarto, mudado de cidade cinco vezes para segui-lo nas trocas de emprego, tinha se humilhado, implorado, chorado, gritado, tinha feito tudo o que as mulheres apaixonadas fazem e ido mais além. Ele continuava indiferente, oferecendo as migalhas de uma amizade que a torturava, mas sem a qual não sabia viver. Um dia, Débora desencantou. Ocorreu quando aquele cara novo tinha entrado na sala de aula, sorrindo para ela. Ele perguntou se ali era a turma de Literatura Comparada I. Depois, puxou a cadeira sem cerimônia, sentou ao seu lado, pegou seu caderno de capa lilás e escreveu: “Oi, me chamo Orlando e você tem os olhos verdes mais bonitos que já vi na vida!” O mundo voltou a mover-se, a henna desbotou, uma pintura no quarto apagou o nome de Everaldo, outra pintura riscou por cima o de Orlando, tatuado com agulha, em letras verdes e brilhantes, na pele de Débora. A casa dos dois era amarela, mas o jardim tinha todas as cores. Tiveram dois filhos e duas filhas. Havia dois cachorros, o gato Snack e a coelha Pretinha…Everaldo? Corre atrás dela até hoje. Se descabela, implora, pinta seu nome nas paredes, se humilha, promete o céu, a lua, chora e lamenta o tempo perdido.

*Originalmente publicado em fevereiro de 2010, na série Mulher Sem Retoque, do meu blog pessoal, o Mar de Histórias.

**Andreia Santana, 37 anos, jornalista, natural de Salvador e aspirante a escritora. Fundou o blog Conversa de Menina em dezembro de 2008, junto com Alane Virgínia, e deixou o projeto em 20/09/2011, para dedicar-se aos projetos pessoais em literatura.

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