Honra, lealdade, justiça. Sentimentos nobres. E tenho visto o quão carente está nossa sociedade de atitudes pautadas nestas curtas, porém significativas palavras. Antígona fez aflorar em mim questionamentos sobre a importância de cultivarmos estas sementinhas. O livro, resultado de uma peça escrita por Sófocles, traz a luta de Antígona para dar ao irmão Polinice um sepultamento digno, depois que o rei Creonte -seu tio- proclamou pela cidade a ordem de deixá-lo insepulto, sem homenagens fúnebres, por tê-lo considerado um traidor.
Revoltada com a decisão do rei e disposta a cumprir o que considerava um dever – o de permitir que seu irmão fosse enterrado -, ela tenta ganhar o apoio da irmã, Ismênia. Submissa às leis da terra, no entanto, Ismênia aceita o destino imposto ao irmão, por medo das conseqüências da decisão de desobedecer às ordens superiores. Ela viu os pais morrer, um irmão matar o outro pelo trono do pai e, naquele momento, temia a terrível morte que caberia às duas se contrariassem a vontade do rei. Mas Antígona decide, mesmo sozinha, levar adiante seu plano, e o livro narra a sua saga.
A peça foi encenada pela primeira vez em 441 a.C. E é fácil identificar o contexto histórico inserido naquelas passagens. Grécia, período em que nasciam as cidades (pólis), os indivíduos começam a exigir seus direitos. O livro fala em exercício de cidadania, em democracia, em direitos, em luta pelo que é justo (não no sentido jurídico reducionista do termo), em enfrentar, na importância da luta, de não se deixar curvar diante das aberrações, de se permitir contrariar, desafiar, de ser leal a princípios e de morrer por um ideal que vale a pena.
Antígona fala do hoje, fala de valores que se dissiparam em nossa sociedade. Embora escrito há séculos, traz princípios que deveriam nortear nossas condutas a todo o tempo. Mas que acabamos deixando de lado por razões infinitas. Os diálogos narrados na peça me fizeram repensar nossos papéis de juízes. Em quantas vezes vestimos nossas togas e disparamos sentenças para todos os lados. Pra mim, ali está um material farto sobre sociologia jurídica. Um texto curto, fácil de ler, e que pode suscitar debates sobre a dicotomia jurídica do “ser” e do “dever ser”.