O seu corpo continuava o mesmo de quinze anos atrás. Seu rosto, o tempo fizera a gentileza de não pregar marcas. Não havia rugas, sequer linhas de expressão. Não fosse pelo olhar mais maduro e pelos pneuzinhos nas costas, certamente teria a impressão de ainda estar vivendo o passado. Nos encontrávamos com uma certa frequência, em um quarto de motel. Ali dentro passávamos horas do dia em nosso universo paralelo, sem problemas ou rotina. Ao final, pagávamos a conta, o ingresso forçado à vida real. Quando a saudade apertava, uma mensagem sugestiva no celular era suficiente, e lá estávamos novamente, em nosso faz de conta particular, entre risos, dengos e roçar de pernas. Era cômodo para nós dois: sem satisfações, angústias, DRs ou cobranças. Assim eu pensava que nossa história era contada. Até sentir a primeira ponta de quero mais. Por um tempo, o medo de desconstruir aquela relação me atormentou. A intimidade é uma merda, seria possível conquistá-la com outro alguém? Perguntava-me constantemente. Embora enxergasse a resposta com nitidez, arranjava desculpas esfarrapadas para me convencer do contrário. E assim foi-se o tempo. Hoje estou aqui sozinha, deitada na mesma cama que costumávamos dividir, escrevendo esta carta que jamais deixarei chegar a tuas mãos, questionando-me se algum dia me arrependerei da decisão de ir embora de sua vida e com a certeza de que ainda não é o momento de pensar nesta resposta.