Santo Amaro em evidência

Santo Amaro da Purificação é uma das cidades mais místicas do recôncavo baiano.  E não digo isso porque é terra de Caetano Veloso e Maria Bethânia. Aliás, os dois grandes artistas são o que são porque nasceram e se criaram num caldo cultural que mistura a religiosidade afro-brasileira, tradições católicas, cultura popular e história de resistência. Pois a cidade, localizada a 72 quômetros de Salvador,  estará em evidência nos próximos dias. Aqui na capital, de hoje até domingo, o Conjunto Cultural da Caixa (Rua Carlos Gomes – Centro) apresenta o espetáculo teatral Besouro Cordão de Ouro, sobre a vida de um dos capoeiristas mais famosos de Santo Amaro, um homem tão peculiar que se não houvesse testemunhas jurando que ele existiu, passaria facilmente por lenda e das boas, daquelas de ouvir ao pé da fogueira. Além disso, de 13 a 17 de maio, a cidade do recôncavo celebra os 120 anos do Bembé do Mercado, festa criada em 1889 para comemorar a abolição da escravatura. Abaixo, informações sobre o espetáculo e a história do Bembé:

Besouro Cordão de Ouro

Cena do espetáculo Besouro Cordão de Ouro
Cena do espetáculo Besouro Cordão de Ouro

Manoel Henrique Pereira, apelidado Besouro Cordão de Ouro, nasceu em Santo Amaro no final do século XIX. Ficou famoso graças ao talento nas rodas de capoeira tanto na cidade natal quanto no Cais Dourado, em Salvador, onde desembarcava dos saveiros que cruzavam a baía de Todos os Santos, em busca de um bom desafio. Sua fama de valente o transformou em lenda viva. Sendo que o romance Mar Morto, de Jorge Amado, ajudou a consolidar a fama do lutador. Além de capoeirista, Besouro também era poeta, boêmio, tocador de violão dos mais afamados e compositor de chulas e sambas-de-roda.

O espetáculo Besouro Cordão de Ouro, que aporta em Salvador neste fim de semana, é produzido por um grupo carioca, sob direção de João das Neves. O texto, as músicas e letras das canções entoadas na peça  são de autoria de Paulo César Pinheiro. A história de Besouro, também chamado Mangangá nas rodas de capoeira, é contada a partir dos atores que interpretam outros mestres famosos do ínicio do século XX como Bimba, Pastinha, Budião, Dora das Sete Portas e a mítica Rosa Palmeirão, também personagem de Mar Morto e que, diz a lenda, foi criada por Jorge Amado a partir de Maria Doze Homens, uma capoeirista valente do Cais Dourado, que derrubava qualquer um que se interpunha em seu caminho, fosse macho ou fêmea. Maria Doze Homens, por sua vez, é confundida na memória da cultura popular baiana com Maria Felipa de Oliveira, uma mulher que, na Guerra da Independência da Bahia, em 1823, teria liderado outras mulheres na guerrilha contra os portugueses.  Prometo contar a história dela aqui no blog, em outra ocasião.

SERVIÇO:

Espetáculo: Besouro Cordão-de-Ouro

Onde: Espaço Caixa Cultural

Rua Carlos Gomes, 57 – Centro – Tel: 3421-4200

Quando: 8 a 10 de maio, às 20h

Ingresso: Um quilo de alimento não-perecível, trocados pelo ingresso a partir das 14h do dia do espetáculo

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Bembé do Mercado

Caetano deve participar de mesa redonda durante o Bembé
Caetano deve participar de mesa redonda durante o Bembé

A origem do Bembé do Mercado remonta ao dia 13 de maio de 1889, no aniversário de um ano da abolição. Na ocasião, os terreiros de Candomblé de Santo Amaro e região se reuniram para fazer uma festa de três dias e três noites, tocando para os orixás e em memória aos antepassados que pereceram na luta pela liberdade. Durante anos, o Bembé foi erroneamente associado a uma homenagem à princesa Isabel, mas a festa de fato, marcava a resistência dos adeptos do Candomblé às perseguições a sua religião e também era uma forma de mostrar que existia um contingente negro que havia saído das senzalas, mas ainda não havia alcançado lugar de direito na sociedade. Mesmo com as perseguições o Bembé continuou acontecendo. Em alguns anos, limitava-se aos terreiros, em outros, acontecia na praça do mercado municipal da cidade. A partir do final dos anos 90, houve empenho de lideranças negras e religiosos do Candomblé, além de apoio de universidades e políticos, para que o Bembé fosse revitalizado. A palavra Bembé é uma corruptela de Candomblé.

Este ano, cerca de 30 terreiros irão se unir para realizar a festa dos 120 anos do Bembé, de 13 a 17 de maio, na praça do mercado. Além dos rituais religiosos, ocorrerão também apresentações de maculelê, capoeira, samba de roda e a encenação do Nego Fugido, folguedo que tem origem no distrito santoamarense de Acupe e representa a fuga de escravos das fazendas de açúcar da região e a implacável caçada empreendida pelos capitães do mato e feitores na tentativa de recapturá-los.

A festa de 2009 renderá homenagens ao escultor e museólogo Emanoel Araújo e a sambista santoamarense Edith do Prato, morta no início do ano. A programação prevê também uma mesa redonda, que deve ocorrer na quarta-feira, 13, na abertura do evento, sobre cultura popular, reunindo o Ministro da Cultura Juca Ferreira, o cantor Caetano Veloso e a folclorista Maria Mutti; além de um show de J. Velloso e Ulisses Castro.

SERVIÇO:

O quê: Bembé do Mercado

Local: Mercado de Santo Amaro da Purificação – BA

Data: 13 a 17 de maio

Horário: quarta-feira (04h alvorada, 18h abertura), quinta-feira e sexta-feira (18h), sábado (10h)

Como chegar: Saindo de Salvador, pegar a BR-324.  São 59 quilômetros até o entroncamento da BA-026, em direção a Santo Amaro, e mais 13 quilômetros até a sede do município.

4 comentários em “Santo Amaro em evidência

  1. Fui e adorei…Santo Amaro é sem dúvida alguma um lugar especial…Contudo, mal cuidada…Poderia ser muito linda… Vamos ver se vão purificar o rio Subaé como prometem…A família Veloso é…sem palavras…adoro eles…

  2. Tita!

    Estive na festa dos 120 do Bembé do Mercado, o que fui buscar não foi citado na mesa redonda, consegui uma pitadinha de conhecimento em conversa com alguns senhores. Pensei ver João de Obá ser homenageado, mas notei que o referido foi apenas lembrado. O que me entristeceu foi ver os “salve Izabé! (Princesa) ser enaltecida o dia todo, por um carro de som. Se a abolição fosse realizada com responsabilidade, embuido de respeito, atualmente o negro viveria em igualdade, desfrutando os mesmos direitos.
    Voltando ao Bembé do Mercado, para provar que estive por lá, (risos) fiz duas poesias uma em tributo ao babalaô João de Obá, e outra em homenagem a Maria Eunice Martins Luz, a “Nicinha do Samba” musicadas e postadas no site: http://www.Youtube.com/rchynae

    Bembé do Mercado

    Samba de Roda
    Salve a força das águas!
    Salve, salve João de Obá!
    Que confirmou a liberdade,
    reverenciando Yemanjá.

    Obá Xi! Obá! Yemanjá Odoyá!
    Obá Xi! Obá! Odoyá Yemanjá!

    Eu fui a Santo Amaro,
    fui para ver como é que é,
    no mercado, o ritual,
    ao culto dos orixás,
    na festa do Bembé.

    Obá Xi! Obá! Yemanjá Odoyá!
    Obá Xi! Obá! Odoyá Yemanjá!

    Hoje é parte da história,
    no mercado festejar,
    a sonhada liberdade,
    a sonhada liberdade!
    Todos vêem comemorar.

    Com honra, cheio de glória,
    o negro a sambar,
    no maculelê e capoeira,
    sua arte vem mostrar,
    sem esquecer o fundamento,
    do treze de maio de João de Obá.
    Sem esquecer o fundamento,
    do treze de maio de João de Obá.

    Obá Xi! Obá! Yemanjá Odoyá!
    Obá Xi! Obá! Odoyá Yemanjá!

    Treze de Maio em Santo Amaro

    Samba de roda

    Dia treze de maio,
    antes do sol raiar,
    na praça do mercado,
    todos vão comemorar.
    Na praça do mercado,
    o bembé sempre a tocar.

    Obá Xi, Obá! Obá Xi, Obá, Odoyá!
    Obá Xi, Obá! Obá Xi, Obá, Yemanjá!

    Na cadência do bembé,
    Yemanjá vamos louvar!
    Tal qual o agradecimento,
    do babalaô João de Obá.

    Arrojado e destemido,
    desrespeitou a tradição,
    contra tudo e contra todos,
    comemorou a libertação.

    Obá Xi, Obá! Obá Xi, Obá, Odoyá!
    Obá Xi, Obá! Obá Xi, Obá, Yemanjá!

    Confirmou o feito,
    a Olorum pedindo agô,
    e na Praça do Mercado,
    ele veio bater tambor.

    Quem nunca viu!
    Venha ver para crer,
    lá na Praça do Mercado,
    a curtição é para valer,
    tem capoeira, chula, e maculelê,
    tem o Samba de Roda de Nicinha,
    que é muito gostoso de se vê.

    Fraternal abraço,

    Chynae, o poeta solidário.

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